O valor da lealdade em tempos de crise

Sobre se sentir pertencente a um grupo e receber apoio em tempos difíceis

Luana Reis
Releituras da Vida

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Você sente que pode confiar nas pessoas com quem trabalha, estuda ou convive diariamente?

Já vivenciou situações que foram capazes de evidenciar com quem realmente pode contar diante dos desafios e conflitos?

Bem, há alguns dias enfrentei uma situação desagradável e desafiadora no trabalho. Foi bem desgastante. Mas uma coisa ficou em meu coração:

A importância de ter ao seu lado pessoas que confiam em você, que te dão a retaguarda, te dão suporte, antes mesmo de saber detalhes do ocorrido.

Eu sou médica e atuo na atenção primária, ou seja, em posto de saúde. Desde que me formei trabalho no mesmo posto. E gosto muito de lá, por algumas razões que ficaram ainda mais claras após vivenciar a história que vou te contar.

Em certo dia da semana, fui convidada pela coordenação para fazer uma cobertura em outro posto da rede, seria por apenas um dia, pois estavam em processo de troca de médico. Tratava-se de um posto com apenas uma equipe, ou seja, apenas 1 médico.

Aceitei de bom grado e nunca passou pela minha cabeça que pudesse ter qualquer complicação relacionada ao fato. A princípio não teria porque ter. Mas às vezes a vida nos apresenta situações imprevistas e improváveis mesmo.

E foi assim que o improvável aconteceu. Justamente na hora do almoço, um paciente passou mal, a equipe de saúde ficou assustada, precisaram chamar o SAMU… A história é um pouco longa e optei por não descrevê-la na íntegra por aqui.

O fato é que por ter acontecido em um momento tão inoportuno, para um observador descuidado, de acordo com a forma como esse fato poderia ser relatado, eu poderia ser colocada como médica “ausente” ou “negligente”.

Para o meu azar, a enfermeira desse posto optou por pedir ajuda no grupo de outras enfermeiras do polo daquela região, expondo o caso de forma desfavorável para mim, talvez por estar no calor do momento. Para minha sorte, nesse mesmo grupo, estavam as enfermeiras com quem trabalho em meu posto original, todos os dias, há mais de 1 ano.

Elas me conhecem, sabem como sou. Uma delas me relatou o fato e fiquei sabendo que ela havia me defendido, com classe e delicadeza nesse grupo, antes mesmo de saber detalhes do que realmente havia acontecido.

Fiquei emocionada ao ver o suporte que pude receber dessa colega.

Eu sou uma profissional em processo de aprendizado e crescimento, não há dúvidas. Falível e humana. Mas certamente não me considero descuidada, muito menos negligente. Na vida, situações improváveis e imprevistas são possíveis em diversos níveis e diferentes situações. Fiquei muito feliz em ver o apoio que pude receber da minha equipe.

Recebi apoio também da gerente do meu posto habitual, assim como do médico coordenador, os quais se prontificaram em me ligar e esclarecer a situação. Todos puderam me ouvir, entender a situação segundo a minha perspectiva e puderam, a partir disso, me acolher da forma que fosse possível.

Percebemos que não houve culpados nessa situação, houve apenas um desencontro. Até mesmo com a gerente e a enfermeira do posto em que estava naquele dia, após tudo se acalmar, sentamos, conversamos e esclarecemos, e ficou tudo resolvido.

Cuidado em saúde não se faz sozinho jamais.

Às vezes noto uma supervalorização da figura do médico, centrando o valor principal do cuidado nesse profissional. Mas isso é inadequado e injusto. Cuidado em saúde na atenção primária, por exemplo, não é viável sem o agente comunitário de saúde, esse profissional conhece melhor do que ninguém aquela comunidade e aquela região. Sem as técnicas de enfermagem, não seria possível administrar as medicações, coletar os dados vitais, aplicar as vacinas. Sem as enfermeiras, a equipe ficaria desorganizada, sem gestão e a triagem do fluxo ficaria sem critério. A gerente do posto organiza os fluxos, os horários, as regras, as funções de cada um. O pessoal do administrativo faz os atendimentos na recepção, fazendo marcação nas agendas e esclarecendo dúvidas. Enfim! Somos uma equipe em saúde, ninguém trabalha só. Eu não trabalho só.

Nesse dia, mais do que nunca, eu pude sentir na pele o valor de se ter uma equipe que trabalha coesa, em sintonia. Acima de tudo, uma equipe que se reconhece não apenas como colegas de trabalho, mas também como uma família. Tenho a alegria de dizer que trabalhando onde trabalho, a cada dia, me sinto feliz de estar com aquelas pessoas, me sinto pertencer a um grupo.

Enfrentar uma situação desafiadora fora do meu local de trabalho habitual e receber o apoio e o suporte dos meus colegas, mesmo longe… isso não tem preço. É algo que se constrói, a cada dia, ao longo do tempo. Se constrói a parceria e a confiança. Me faz perceber que estar ao lado de pessoas que estão com você, mesmo nas crises, pode ser um dos elementos de maior valor possível.

É diferente quando todos se dispõem a se apoiar e a aprender juntos. Mesmo quando alguém erra, se distrai, ou acontece algum imprevisto. Somos humanos, falíveis, somos equipe. O papel de cada um é indispensável.

Não sei qual o contexto em seu trabalho. Como você se sente diante de seus colegas. Mas se tem algo que percebi que deve ser almejado e buscado é isso:

Procure sempre formar equipes que transcendam o puro e simples profissional. Veja que, ao seu lado, estão também pessoas. Trabalhar lado a lado com quem não é um mero colega, mas também pode ser um parceiro, é algo que pode aumentar muito o bem estar no trabalho. Em meio a dias tão exaustivos e cansativos que podemos enfrentar em nosso campo de atuação, estar em um local que nos traz sentimento de pertencimento e de tranquilidade, não tem preço!

O oposto disso pode ser um grande fator de adoecimento, sentimento de mal estar, menos valia ou desvalorização no trabalho. Como sentir desconfiança, deslealdade, insegurança em relação aos demais colegas.

Ao final, tudo se esclareceu. Tivemos a oportunidade de conversar, de entender o ocorrido e ficou um grande aprendizado para todos os envolvidos, não há dúvidas. Assim como em cada desafio, senti-me grata, e sei que os pequenos desafios de cada dia vêm para que possamos nos preparar pouco a pouco para os grandes desafios que ainda virão.

Já dizia o poeta Charlie Brown:

“Na minha vida tudo acontece
Mas quanto mais a gente rala, mais a gente cresce (…)
Histórias, nossas histórias
Dias de luta, dias de glória”

E eu acrescento; Faça o que fizer, faça com amor e o máximo de dedicação que puder, pois assim, cada boa ação que fizer, para cada pessoa que for impactada, direta ou indiretamente, esse bem advogará ao seu favor nos momentos difíceis.

Como dizia Chico Xavier:

Cada boa ação que você pratica, é uma luz que você acende em torno dos próprios passos.

E depois de tudo isso, uma reflexão importante ressoou em minha mente: as relações interpessoais podem apresentar grande impacto em diversos aspectos de nossa vida. Desde a vida pessoal, os afetos, até as relações do trabalho como um todo. Boas relações fazem toda a diferença.

Bem, isso são apenas algumas reflexões baseadas em minhas vivências. E você? O que pensa sobre?
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Luana Reis
Releituras da Vida

Releituras da vida. A arte da busca pelo equilíbrio entre o que importa e o que é necessário.